quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Fusca

Se eu me levantar desta cadeira da qual eu vos escrevo, andar oito passos em direção à sacada e olhar para o outro lado da rua, eu verei, separado de mim por uns bons 500 metros (horizontalmente falando), um Fusca. É um Fusca bege, fabricado em 1976, com placa de Americana e um adesivo do auto-posto Floreal no para-brisas. Mais importante que tudo isso: é o MEU Fusca.

Meu Fusca. Admirem-no.


Fuscas são máquinas fantásticas. Tanto pela engenharia delas, quanto pelo efeito cultural que eles causaram no mundo. Um Fusca atrai reações inflamadas. Ou se ama, ou se detesta. É quase uma disputa política: existem os Fusquistas e os anti-fusquistas (ou, como eu prefiro chamá-los, Novo-unistas). Eu sou um militante fervoroso do primeiro grupo. Se dependesse de mim, todos os automóveis do mundo seriam baseados no Fusca. As ruas seriam dominadas por Fuscas, os caminhões seriam parecidos com Fuscas, as limosines seriam Fuscas alongados, os ônibus teriam os paralamas redondos. O mundo seria um lugar bem mais legal.

Mas não.

Os carros de hoje em dia são cada vez menos parecidos com Fuscas. São espaçosos, aerodinâmicos, silenciosos, tem um porta-malas de verdade atrás e um motor na frente. Em suma, são feitos para que você os dirija com o mínimo de esforço possível. Como se dirigir fosse um ônus, uma obrigação.
O Fusca segue o caminho inverso. Visto de fora, é uma coisa até meio desengonçada. Não parece seguir nenhuma regra de aerodinâmica. Chega a ser engraçado. Ao entrar nele, você imediatamente sente o delicioso cheiro da gasolina adentrando em suas narinas. Ao ligá-lo, o motor ruge atrás de você como uma besta selvagem enjaulada. Para combater o calor, você abre o vidro e sente o vento no rosto.

Resumindo: os carros modernos são como uma prostituta: você paga, faz seu serivço, vai embora, e no outro dia você talvez nem se lembre direito do que aconteceu. Já um Fusca é como uma esposa: pode te dar um monte de dor de cabeça, mas, no final, você ainda vai gostar dele.

Exatamente como ocorre nesse momento. Da sacada do prédio, eu sou capaz de ver meu Fusca, estacionado na mesma vaga faz quase uma semana, por motivos de falha mecânica. Com um carro comum, eu ficaria puto, e provavelmente estaria sentado nessa cadeira xingando a mãe de quem quer que tenha criado a montadora do carro. Porém, como se trata de um Fusca, estou aqui vangloriando essa magnífica criação da humanidade.


(Bonus) Eu, dirigindo meu Fusca. Notem minha cara de felicidade (e minha camiseta do Abbey Road).

Nenhum comentário:

Postar um comentário